Teatro Popular Pernanbucano - Considerações
Um teatro que não tem fim.
Onde quer que seja o espaço cênico (lugar da representação), ao ar livre das praças ou trancafiado nas quatro paredes de uma casa de espetáculos, o teatro popular estará sempre presente no universo cênico no decorrer dos tempos, recriando e inventando impulso para a sua sobrevivência. Foi assim com os gregos antigos, foi assim com Skakespeare (1564 - 1616), da mesma forma com Molière (1622 - 1673) e assim tem sido com o teatro de Ariano Suassuna (1927).
A dramaturgia nordestina vem dando uma contribuição impagável ao teatro popular no Brasil, com uma profunda riqueza de linguagem e estética, onde o aspecto folclórico é apenas uma das opções dramáticas, mas, sobretudo, a identidade cultural no que diz respeito ao supra-sumo da natureza desse povo é posta em discussão. Temas e carpintaria teatral nos textos de: Luiz Marinho (PE), Isaac Gondim (PE), Lurdes Ramalho (PB), Oswald Barroso (CE), Vital Santos (PE), Tácito Borralho (MA), Racine Santos (RN), Ronaldo Correia Brito (PE), entre outros da atualidade, são verdadeiras obras-primas de um teatro popular. Da mesma forma, nomes saudosos como Joaquim Cardoso, José Carlos Cavalcanti Borges, Osman Lins, Hermilo Borba Filho, entre tantos, continuam presentes nesta corrente de um teatro que é do povo, como do povo é a obra de João Cabral de Melo Neto, o poeta pernambucano mais encenado no teatro popular brasileiro.
"O meu nome é Severino
Não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
Deram então de me chamar
Severino de Maria".
posted by Núcleo de Teatro de Rua ELT at 9:13 AM | 0 comments
UMA ORIGEM DE BRINCADEIRAS
Abram Alas pros Menestréis,João Grilos e outros Capetas mais.
A história do teatro na cidade do Recife registra momentos férteis de um tipo de linguagem chamada Teatro Popular. A expressão teatro popular é bastante complexa e leva a um discurso à parte sobre o que é e o que não é popular.
Tomando como referencial o pensamento de Hermilo Borba Filho que diz "a arte popular é toda aquela surgida espontaneamente entre o povo, o povo mais simples de uma sociedade, o resto, é uma sofisticação em nome do gosto popular", recorremos aos autos e folguedos que encontraram berços esplêndidos nos bairros recifenses, como verdadeiras manifestações populares de um teatro não declarado, pelo simples fato desses artistas populares dos bumbas-meu-boi, dos pastoris, dos cavalos marinhos etc., não terem a consciência dos atores e atrizes que eram (ou que são), nem tampouco serem respeitados como verdadeiros artistas, pelas camadas dirigentes da sociedade. Mesmo assim, esses brincantes marcaram época e continuam a influenciar artistas dos mais variados segmentos até hoje, a exemplo dos espetáculos teatrais de Antônio Carlos Nóbrega, os shows musicais de Alceu Valença, a dramaturgia de Ariano Suassuna, as encenações do Teatro União e Olho Vivo da cidade de São Paulo, entre muitos outros. Assim sendo, o teatro popular na cidade do Recife tem a idade da migração do homem do campo à cidade grande, trazendo em seus bens as preciosidades de um ganzá, de um pandeiro envolto em fitas, ou mesmo de uma bexiga de boi, em substituição às máscaras gregas da Procissão Dionisíaca (berço de tudo o que se chama teatro na civilização ocidental).
Os principais elementos que compõem uma representação teatral, tais personagens em conflito; signos em ação e comunhão entre público e artistas no jogo do faz-de-contas, também estão presentes e evidentes nos folguedos populares, basta lembrar os personagens Bastião, Mateus, Capitão e Catirina, que no jogo cênico do "brinquedo" travam diálogos como esse de um Bumba:
CAPITÃO - Mateus, vem cá!
MATEUS - Pronto, sinhô.
CAPITÃO - Que negócio é esse?(aponta para um morto carregando um vivo que surge no meio da roda)
MATEUS - Sinhô, eu não sei não, eu tou assombrado, eu nunca vi isso.
CAPITÃO - Vem cá, Sebastião!
BASTIÃO - Pronto, sinhô
CAPITÃO - Tu tem coragem de examiná aquela marmota que apareceu ali?
BASTIÃO - Eu tenho, sinhô. Agora,sozinho eu não vou não.
Com representações desta natureza, entre tantas, o Capitão Antônio Pereira marcou com dignidade e perseverança um dos mais autênticos teatros populares nordestinos, na cidade do Recife, com o seu saudoso Boi Misterioso. Com esse boi, o Capitão Antônio Pereira chegou a levar à cena 31 personagens (figuras) em encenação de rua (brinquedo de terreiro), no bairro da mustardinha, onde era sediado.Mas nem só das brincadeiras vivaldinas dos Joãos Grilos e outros menestréis encapetados, vive o teatro popular.
Seja na capital ou no interior pernambucano, outras expressões desse teatro se manifestam, tais como Mamulengo, Drama Circense e o Teatro de Rua, considerados por artistas e imprensa, como os verdadeiros embaixadores do Teatro Popular.
posted by Núcleo de Teatro de Rua ELT at 9:03 AM | 0 comments
DRAMA CIRCENSE
Depois do Riso, Lágrimas Invadem o Picadeiro.
Nem só de risos vive o mundo do circo. Depois do palhaço, do mágico, do malabarista, do trapezista etc., surgem esses mesmos artistas, como atores, deixando os espectadores num silêncio de morte, acompanhando, passo a passo, o desenrolar do drama circense. São encenações aproximadamente com uma hora de duração, tempo suficiente para os personagens passarem para uma posição de extremo oposto e, no mais das vezes, retornarem a tranqüilidade e normalidade inicial do drama, em grand finale.
São famílias afortunadas que sofrem a perda dos bens em jogos ou bebedeiras; casamentos desfeitos por intrigas de terceiros; doença grave causada por um castigo de Deus; o surgimento de um filho bastardo; um namoro proibido por questões raciais ou de diferenças sociais etc. Ou seja, temas de forte apelo sentimental, em encenação de um teatro naturalista, com exagerada dose de realismo cênico, que não levam a outra resposta do público, se não às lágrimas. São, na realidade, situações possíveis a qualquer mortal, sendo que, apenas o povo mais simples, sem preconceitos, conversa naturalmente no dia a dia sobre elas, sem vergonha, culpa ou pedido de perdão pelo pecado. Assim constitui-se a mola mestra da dramaturgia circense, "o drama da lona".
A dramaturgia é carregada de moralismo e ingenuidade, normalmente de autoria desconhecida, e quase total inexistência do texto escrito. Os atores circenses sabem decorado todos os textos, que aprendem ouvindo os companheiros nas apresentações, ao ponto de poder interpretar qualquer personagem, pois a prática do revezamento de papéis e intérpretes, é constante.
No maravilhoso mundo do circo,
também há espaço
para a dor e a tristeza.
No drama circense a estética cênica não corresponde à mesma observada nas companhias teatrais, visto que para esses artistas mambembes do picadeiro, o drama se resume à "mensagem" pura e simplesmente. E para isso vale tudo; do apelo mais fatal como um tiro no peito, ao banal surgimento de uma carta anônima, ou ainda às catastróficas previsões de uma cigana. São esses os recursos infalíveis para o desenvolvimento da encenação circense.Peças como O Ébrio, O Filho Perdido e A Louca do Jardim, fizeram, por décadas a fio (dos anos 40 aos anos 70) parte do repertório obrigatório dos circos que percorriam a capital e o interior pernambucano. Hoje, raramente encontra-se uma montagem de Drama Circense, na segunda parte da função (espaço que era dedicado exclusivamente para a encenação do drama), trocado que foi pelos shows dos cantores de música romântica
posted by Núcleo de Teatro de Rua ELT at 8:53 AM | 0 comments
TEATRO POPULAR DO NORDESTE - TPN
Uma Experiência de Identidade Cultural Trabalhar os valores culturais do povo nordestino em forma de teatro, mesmo que esse teatro fosse uma encenação dos trágicos gregos ou ainda de outros estrangeiros de gerações mais próximas como Ibsen e Garcia Lorca, era o ideal de um grupo de atores, técnicos e outros artistas engajados ao TPN, liderados por Hermilo Borba Filho e Ariano Suassuna.
Fundado em 1958, o Teatro Popular do Nordeste dava, na verdade, continuidade ao trabalho artístico e cultural dos ideais do Teatro do Estudante de Pernambuco (fundado em 1946), onde se buscava a redemocratização da arte cênica brasileira, partindo do princípio de que, "sendo o teatro uma arte do povo, deve aproximar-se mais dos habitantes dos subúrbios, da população que não pode pagar uma entrada cara nas casas de espetáculos e que é apática por natureza, de onde se deduz que os proveitos em benefício da arte dramática serão maiores levando-se o teatro ao povo em vez de trazer o povo ao teatro". - Estas palavras pronunciadas por Hermilo em sua conferência na Faculdade de Direito do Recife, em 1945, tornaram-se de fato um manifesto que criou o Teatro do Estudante de Pernambuco, abrindo um caminho a ser percorrido, com os devidos ajustes, pelo Teatro Popular do Nordeste.
Como o nome sugere, o TPN fez questão de valorizar a literatura, o teatro e a poesia popular nordestina, levando ao palco de sua casa de espetáculos na Avenida Conde da Boa Vista, a preço popular, montagens que transpiravam os costumes do povo desta terra, exatamente como se punha artisticamente o Teatro do Estudante de Pernambuco nas praças e pátios ao ar livre, de graça, mas que, por questões econômicas o TPN (que era um grupo profissional) necessitava de um edifício teatral que permitisse cobrar ingresso. Ingresso a preço que possibilitassem os operários e os estudantes assistirem aos espetáculos.
Defendendo um projeto de cultura popular através do teatro, o TPN definia assim a sua ideologia: "Nosso teatro é popular. Mas, popular para nós, não significa, de maneira nenhuma, nem fácil nem meramente político. Incluem-se aí os trágicos gregos, a comédia latina, o teatro religioso medieval, o renascimento italiano, o elizabetano, a tragédia francesa, o mundo de Molière e Gil Vicente, o século de ouro espanhol, o Teatro de Goldoni, o drama romântico francês, Goethe, Schiller, Anchieta, Antônio José, Martins Pena e todos aqueles que no Brasil, principalmente no Nordeste, vêm procurando e realizando um teatro dentro da seiva popular coletiva" - Reencontra-se nesse pensamento e nessa atitude do TPN, como teatro declarado popular e legítimo, agora com palco, o que o canto, a dança e a música já faziam nos autos folguedos espalhados pelas ruas. Ou seja, a celebração de uma arte popular, identificada e acessível a comunidade em que ela está inserida.
posted by Núcleo de Teatro de Rua ELT at 8:40 AM
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